30.8.07
Um óbito
Sentimentos…que todos os dias se alteram, nesta terra em que o tempo tanto corre, como não passa por nós.
Hoje o dia começou com um funeral, como se diz aqui, um “óbito”. A tia da Ivone faleceu e o funeral foi hoje no Cemitério do Alto das Cruzes (no Bairro Miramar).
Chegámos ao Cemitério, o calor era imenso, abafava, fazia suar pelo rosto abaixo. Vimos então, já o acompanhamento de um funeral.
Não sabíamos se era aquele. Faltavam 5 minutos para as 13h e podia ser outro.
Perguntei a uma mulher, que no seu compasso lento, seguia aquele grupo pesaroso e respondeu-me que era o funeral da Marisa. Agradeci e lembrei-me vagamente do nome, por várias conversas que a Ivone teve comigo.
Este funeral envolveu-me de vários sentimentos. Naturalmente que qualquer funeral ainda me faz recordar a morte da minha mãe. Mas para além dessa inevitabilidade, fez-me lembrar os funerais de negros noutras partes do mundo.
Não se estava a festejar a morte como em New Orleans, mas a tristeza profunda de uma partida sem regresso.
E em Angola, como provavelmente em toda a África, a expressão da dor é mais exteriorizada, manifestam-na sem reservas ou preconceitos.
Essa expressão parece também o evocar das almas dos que já lá estão. E por isso os chamam, a mãe, o pai, o irmão, o sobrinho, todos aqueles que um dia partiram e nunca mais voltaram.
Num dado momento, já no local onde o caixão iria baixar à terra, rezou-se um Pai Nosso, uma Avé Maria e houve cânticos de voz arrastada e triste.
As exéquias continuaram e voltou-se a repetir o Pai Nosso e a Avé Maria.
Os homens encarregues de enterrar o caixão, pegaram nas cordas… e mal terminou esta última oração, ouviram-se gritos, autênticos uivos lancinantes, assustadores… O sentimento genuíno, vivo, de uma dor incontida.
Ficámos petrificados, com todo aquele clima de dor e saudade, de expressão sem medo do ridículo, de um extravasar da intimidade, em que mulheres e homens, o fizeram da mesma forma.
Quando vimos a Ivone, ela vinha amparada pela família, a chamar pela mãe “eu quero a minha mãe aqui, já!”, “quero a minha tia!”… enfim, derramou naquelas lágrimas, todas as vontades que o coração pediu.
Pediu… sem ser atendido.
E com esta morte, aprendi mais uma regra de vida: não vale a pena disfarçar, mascarar a verdade. Fiz muito bem em chorar a minha mãe durante o tempo que precisei… e sempre que tiver vontade de o fazer.
Rita Jasmim
Etiquetas: afectos, áfrica, rita j, viver
Comments:
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Li e gostei. Lamentavelmente não conheço a África. A Verdadeira a lá do Sul. Na do Norte estive na Líbia, Egipto e ETiópia. Quando me quiseram enviar para as guerras coloniais já eu andava noutra guerra contra essas.
Gostei do post.
Fui ver quem era o cds só fiquei a saber a idade. Afinal somos quase da mesma idade eu tenho 105.
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