Para além da vida das abelhas e das flores 2: a estratégia do "império"

Após o choque do 11/9, as estratégias da América passaram para uma dupla abordagem:
- Uma é diplomática multilateral, quer em articulação com outras potências (particularmente Rússia, China e Europa), quer com as instituições de regulação internacional (particularmente ONU e AIEA); é preferencial porque tem maior legitimidade.
- Outra, em simultâneo, assumidamente unilateral, de confronto, impondo sanções, mantendo uma politica de exibição de força militar (que no caso do Iraque foi até ao extremo); não é preferida mas é claramente afirmada como uma opção.
Estas duas atitudes, têm como finalidade, alterar o comportamento dos estados, que tentem armar-se com programas nucleares e tecnologias míssil. Este comportamento ambivalente consta de documentos estratégicos públicos, e é denominado pela administração americana com estratégia Uni-Multilateral. É nesta perspectiva que designaram estados como “párias”, e se inventou um “Eixo do Mal”, com o Irão, a Coreia do Norte e o Iraque.
Mas isto, nunca foi exclusivo americano. Mesmo sem anúncio estratégico formal, a maior parte dos países age tanto unilateralmente, como multilateralmente. Pela primeira, em defesa dos seus interesses vitais (segurança nacional) na sua zona de influencia; pela segunda no prosseguimento de causas globais e de segurança internacional. Quanto maior for a área de influência estratégica de uma potência e maiores forem as suas capacidades, maior é a tendência para agir unilateralmente e maior o número de países e interesses afectados.
Convém pois recordar, os principais entre os inúmeros casos de uso da força, sem autorização do Conselho de Segurança, e que não podem ser colocados numa concepção razoável de legitima defesa - a única opção aceite pelo capítulo VII da Carta das Nações Unidas:
1948 – Acção da URSS na Checoslováquia
1950 – Invasão da Coreia do Sul pela Coreia do Norte
1954 – Acção dos EUA na Guatemala
1956 – Invasão do Egipto por forças de Israel, França e Reino Unido
1956 – Invasão da Hungria pela URSS
1960 – Acção do Vietname do Norte contra o Vietname do Sul
1961 – Invasão da Baia dos Porcos em Cuba, apoiada tacitamente pelos EUA
1961 – Invasão de Goa portuguesa pela Índia
1965 – Invasão da Republica Dominicana pelos EUA
1968 – Invasão da Checoslováquia pelas forças do Pacto de Varsóvia
1973 – Acção árabe na “guerra dos seis dias” contra Israel
1975-Invasão de Timor pela Indonésia
1975 - Invasão de Angola pela África do Sul
1979 – Invasão do Cambodja pelo Vietname
1979 – Invasão soviética do Afeganistão
1979 – Invasão do Uganda pela Tanzânia
1982 – Invasão das Falklands britânicas pela Argentina
1983-Invasão de Granada pelos USA
1989 – Invasão americana do Panamá
1990 – Invasão do Koweit pelo Iraque
1999 – Intervenção da NATO contra a Sérvia, por causa do Kosovo
Na realidade, todas as grandes potências já usaram da força em violação da Carta das Nações Unidas.
(de Luís L. Tomé, Novo recorte geopolítico mundial, UAL 2004)
Etiquetas: Iraque, ONU, politica, USA
Para além da vida das abelhas e das flores 1

Sem equilíbrio de poderes nem rival estratégico, os Estados Unidos da América afirmaram-se como super-potência, tornando obsoletos muitos dos paradigmas e conceitos até aí existentes.
Um deles foi o do estado soberano tradicional, herança antiga da ordem vestefaliana, que está hoje confrontado com poderosas pressões de cima, de baixo e de dentro, em virtude da globalização e da concorrência com outros actores internacionais (organizações internacionais, não governamentais, etc).
O estado já não detém o monopólio da força, como era pressuposto na ordem antiga, e a ameaça à segurança vém cada vez mais de grupos não estatais.
Hoje podemos dizer que a América é (ainda e por enquanto) o único poder totalmente soberano.
Outro paradigma que se alterou foi o Terrorismo, que nunca como hoje constituiu tão perigosa ameaça para a segurança internacional.
Além disso, é também evidente que essa ameaça é indissociável das armas de destruição massiva (ADM).
A redução das soberanias conjugada com estas ameaças – Terrorismo e ADM – aumenta exponencialmente o perigo para todos.
A Geopolítica mundial entrou assim numa nova fase.
Os analistas não se têm poupado a multiplicar visões para perceber o sentido da “nova ordem” pós guerra-fria: Fim da História, Choque das civilizações, Geopolítica do Caos, Pax americana, Idade imperial, etc.
Considero adequado definir a actual estrutura de poder mundial, como um modelo híbrido, complexo e original, que se pode designar por Uni-Multipolar*, caracterizado pela coexistência de dois vastos movimentos geostratégicos:
- Por um lado, a guerra contra o terrorismo, a proliferação das armas de destruição massiva;
- Por outro, o jogo de contenções múltiplas entre a pressão hegemónica dos EUA e os que se batem no sentido de a contrariar.
*Luís L. Tomé, Novo recorte geopolítico mundial, UAL 2004
Etiquetas: politica, terror, USA