9.8.10
Para-teoria 6: Quinto Império e o Messias Sebástico
A espécie de ideologia religiosa que dá identidade aos portugueses parece-me expressar-se em características antigas e constantes, entre as quais o que antes designei por “Fado Oscilante”, e em segundo lugar, o que designo pela “religião” do Quinto Império prometido: uma crença complexa na escolha transcendente de Portugal. Esta dimensão mítica tem raízes na lenda alcobacense de Ourique, no Joaquimismo do Espírito Santo, e plasmou-se no próprio símbolo nacional (as quinas com chagas). É a visão de um passado glorioso – mas efémero e oculto – prestes a consumar-se novamente no futuro. O seu carácter religioso-romântico reage furiosamente à novidade estrangeira. Tal como o milagre de Ourique, as profecias do Bandarra ou o Quinto Império de Vieira, julgo ver o mito também nas aparições de Fátima, durante a I República. Está lá tudo, a escolha divina de Portugal num momento crucial, o segredo por revelar (nunca se sabe, é brumoso). Como diz Pulido Valente, não se conhece o mecanismo pelo qual se passou em poucos dias de umas dezenas de pessoas para 100.000, mas é nisso que reside o verdadeiro segredo de Fátima. A Virgem andou positivamente a dar um baile às autoridades republicanas. A Igreja Católica, acorreu, solicita, a cavalgar a onda, antes que lhe escapasse das mãos. Mas a questão de fundo é que, o fenómeno despoletado ganhou uma legitimidade sobrenatural, e estabeleceu-se como um fenómeno político, apesar do ateísmo oficial. A fé introduzia-se de novo (de facto, nunca terá estado de fora) com toda a força no domínio da política.
À terceira característica, que julgo ver, chamar-lhe-ei O Messias Sebástico: é claramente a crença (e a espera) no surgimento de alguém que trate de nós – um Sebastião imaginário, que nos ressuscite a antiga idade do Ouro, no esplendor da lenda (e nos livre da política…). Cito Pulido Valente, mais uma vez: “Dia a dia, ano a ano, século a século, a nação, persuadida da sua íntima grandeza, esperou o taumaturgo que a fizesse ressuscitar num sublime esplendor. E taumaturgos não lhe faltaram: Pombal, Linhares, Fernandes Tomás, Miguel, Pedro, Costa Cabral, Fontes, João Franco, Carlos, Afonso Costa, Sidónio Pães, Salazar…” E estes últimos, que temos vivido, acrescente-se.
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