6.10.09
Uma cobrança ao Doutor Polido
Relendo deparei, muito a propósito, com esta velha profecia de Vasco Pulido Valente (30 XII 2006 Público): O presidente e o primeiro-ministro ganham ou caem juntos.
Afirmava o ilustre escriba: “Durante a campanha eleitoral o Dr. Cavaco insistiu muito na cooperação estratégica com o governo. (…) A cooperação estratégica é hoje (2006) pura dependência. O fracasso de um acabou por se tornar necessariamente o fracasso do outro. (…) Ninguém compreenderá que ele tenha sustentado e reforçado a autoridade de Sócrates para deixar o país como o encontrou, empobrecido e torto, na famosa cauda da Europa.”
Escrevi eu, modestamente, na altura:
“Este marranço anti-cavacal vem já da campanha presidencial, onde VPV elegeu o Soares, zurziu o Cavaco e ignorou o Alegre.
Não lhe ocorreu (como diz) que será o primeiro-ministro, não o presidente, quem será responsabilizado (...) independentemente de quaisquer promessas feitas por Cavaco em campanha; a memória é curta e a função presidencial é de árbitro, não de jogador.
Não lhe ocorre também, agora, que é Sócrates quem se está a tornar dependente do presidente, por aceitar (elogiando) propostas e interferências sub-reptícias em domínios exclusivos do executivo, que agora vão no sentido do reforço (estratégia do momento) mas amanhã, com a legitimidade aberta pelos precedentes de hoje, lhe poderão tirar o tapete.
A ninguém (excepto ao VPV) interessará que Cavaco tenha sustentado Sócrates;
O presidente e o primeiro-ministro não ganham nem caem juntos; quando surgir (se surgir) o momento da desgraça de Sócrates, os portugueses voltar-se-ão para o presidente com a mesma carência sebastianista com que se viraram para Sócrates.”
Acrescentava eu, modestamente também, no final…
“Aquilo que vejo de perigoso em Cavaco, é que sendo um político competente, hábil e ambicioso, aproveitará a primeira oportunidade, que julgue de fraqueza irreversível, no governo PS, para de alguma forma, levar a eleições e ao poder, um PSD então muito mais cavaquista; de caminho voltando ao leme da Nação (no seu íntimo e no de muitos, a sua vocação). É por isso que apreciei a imparcialidade relativa de Jorge Sampaio e preferia muito a imparcialidade que Manuel Alegre garantiria.”
Pois é, parece que o Dr. Vasco se enganou desta vez. Afinal, no termo da legislatura, Cavaco espalhou-se ao comprido, colocando em risco a sua própria reeleição, mas Sócrates não caiu, ainda está para durar e tomar posse de outro governo. E prescindo de pormenores explicativos, porque o Dr. Vasco quando corta a direito, está-se nas tintas para pormenores.
Apesar do "momento da desgraça" não ter chegado para Sócrates, mesmo assim Cavaco (ao que parece) tentou mesmo passar uma rasteira a Sócrates, na esteira da "asfixia democrática". Talvez esteja é a ficar velho, porque o impulso com que tentou, foi o mesmo com que se espalhou... arrastando a Dra. Manuela na queda.
Serve-me esta constatação, Dr. Vasco, não para lhe ganhar uns rebuçados, seja como for considero-o um mestre (sem ironia, se bem que às vezes sinta vontade de lhe oferecer um pano encharcado), mas para fazer sentir que o amigo também se espalha muito apocalipticamente nas suas certezas do Apocalipse. Significando assim que talvez (apenas talvez) o fim da Civilização não esteja tão próximo, como costuma fazer crer.
Bem haja!
Etiquetas: política