22.2.09
Mestre Lagoa Henriques
O miúdo riscava o muro esboroado do velho bairro com um pedaço de carvão tentando dar à escala das letras que desenhava uma dimensão maior que a do seu próprio corpo. Suspenso no olhar, rosto aberto a uma alegria incapaz de conter, Lagoa Henriques seguia o trajecto da mão da criança como se dela nascesse o milagre da criação.
(Eduardo Geada in O Risco Inadiável, o Caderno de Desenho, Jubileu do Professor Lagoa Henriques, 1988)
A ceifeira anda danada a apagar a vida. Ontem o Megre, hoje o mestre. Noutro século, com ele e o Carlos apreendi a arte do desenho, em finais de tarde mágicos à beira rio, traços a carvão cruzados com gaivotas, espaços sem tempo, surreais, como a catedral do esteta, onde sons de tocatas esvoaçavam mais os pombos, até ao tecto, no meio de mil objectos capturados ao mundo.
Com cada um que desaparece, vou-me eu também.
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