3.10.06
Huntington
Ainda do artigo de Rui Tavares: citando o Nobel de Economia Amartya Sen, questiona o historiador, “antes de saber se as civilizações se podem chocar ou devem dialogar, é preciso ver bem se esta história de dividir as pessoas por civilizações faz sentido”. E acrescenta o historiador “quem choca ou dialoga não são civilizações mas indivíduos”.
Não estranho a opinião do economista cuja especialidade é a Micro economia; confesso não conhecer o indiano, mas deduzo que a sua tese se concentra no Bem-estar individual (o indivíduo como medida), opondo-se naturalmente à visão Macro económica de grupos, comunidades, civilizações.
Mas estranho o historiador, cuja especialidade é a História, que conhece a estratificação social da revolução industrial, que usa os termos "esquerda" e "direita", e vem agora afirmar que são indivíduos os protagonistas da História (então, a luta de classes?) apagando por milagre, divisões sociais e culturais.
Modestamente, parece-me mais que o período histórico que vivemos (Globalização) é uma gigantesca síntese de culturas (um processo dialéctico, tão caro a alguns noutro século) que necessariamente provoca fricções e conflitos; parece-me um dado de facto; cabe a nós reduzir o fenómeno, mas que para isso, primeiro temos que o reconhecer, não fingir que não existe, e segundo temos que resistir às intolerancias resultantes, mesmo que seja preciso lutar, porque tolerar a intolerancia é instituí-la entre nós.
Lembremos então, a famosa tese de Huntington de 1996 (já foi há uma década, antes do Nine Eleven), que vejo sempre criticada, mas raramente com seriedade científica.
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Bryceart BabelTower
Em finais dos anos 80 o mundo comunista desmoronou-se e o sistema internacional da guerra-fria passou à História.
No mundo pós guerra-fria as diferenças mais importantes entre os povos não são ideológicas, políticas ou económicas. São culturais.
Os povos e as nações estão a tentar responder à mais básica questão que os seres humanos enfrentam: quem somos nós?
E, respondem a esta pergunta da forma mais tradicional, tendo como referencia o que mais conta para eles.
As pessoas definem-se em termos de ascendência, religião, cultura, história, valores, costumes e instituições.
Identificam-se com grupos culturais: tribos, grupos étnicos, comunidades religiosas, nações e a um nível mais amplo, civilizações.
As pessoas usam a politica não só para promoverem os seus interesses, mas também para definirem a sua identidade.
Só sabemos quem somos quando sabemos quem não somos e frequentemente, contra quem somos.
Os Estados-nações continuam a ser os principais actores na cena internacional.
Como no passado, o seu comportamento é moldado não só pela busca de poder e riqueza, mas também por preferências, afinidades e diferenças culturais.
Os agrupamentos mais importantes de estados já não são os três blocos da guerra-fria, mas as sete ou oito maiores civilizações mundiais.
As sociedades não ocidentais, principalmente no Extremo Oriente, estão a desenvolver a sua riqueza económica e a criar a base para um poder militar e uma influência politica reforçados.
Enquanto o seu poder e a sua autoconfiança aumentam, as sociedades não ocidentais reivindicam os seus próprios valores culturais e rejeitam os que lhes são impostos pelo Ocidente.
(…)
Neste novo mundo a política local é a da etnicidade, a politica global é a das civilizações. A rivalidade das superpotencias é substituída pelo choque das civilizações.
Samuel P. Huntington, O choque das civilizações e a mudança na ordem mundial, 1996, pág. 28